quarta-feira, 12 de março de 2008

1. Pública, estatal ou governamental?

Ainda nos primórdios das discussões sobre a nova TV Pública, cogitou-se a criação do canal com a função de ser um meio de comunicação direto entre o governo e o povo, não bastassem os canais oficiais, os pronunciamentos em cadeia nacional e a intensiva propaganda governamental.
O objetivo da nova TV seria acabar com aquilo que o presidente Lula e a base governista entendiam como mau trato à informação no Brasil.

A causa desse mau trato, e até mesmo sua existência, são inidentificáveis: o governo estava se referindo à falta de transparência? À perseguição ideológica "das elites"?

Não por coincidência, pensou-se em criar uma TV com essa finalidade justamente num período conturbado para a imagem do governo, cujas práticas e vontades foram seguidamente contrariadas: derrota no referendo sobre as armas, CPIs, caso do dossiê, fim da prorrogação da CPMF, entre outras.

Mas esse intuito de criar uma TV governista foi descartado após maiores discussões sobre o tema nos congressos e reuniões promovidas pelo Governo, refletindo a ampla rejeição "informal" do congresso e da população. Afinal, esse propósito "chapa-branca" já era reconhecido na NBR – a TV do Governo Federal (leia mais no box abaixo) –, que como um canal governamental serve ao intuito de promoção e divulgação do governo da vez.

O caráter público da nova TV tomou forma, em particular, após a posse de Franklin Martins na Secretaria de Comunicação e com a maior influência exercida por Gilberto Gil, Ministro da Cultura e um dos maiores entusiastas da idéia.

A promoção da cultura local vinda das mais diversas regiões (fora do eixo RJ-SP), a exibição de séries educativas e documentários independentes, a busca pelo jornalismo imparcial e o fomento a discussões sobre cidadania, política e economia devem dar a tônica da nova TV.

A rede, que pretende, no futuro, com o maior aperfeiçoamento da TV digital, contar com outros canais (um educativo, outro infantil) teria na autonomia do Conselho Curador a credibilidade e liberdade necessária para colocar todas essas diretrizes em prática.

Entretanto, o alerta dado pela realidade da Telesur – a "TV bolivariana" multinacional criada por Hugo Chavez em 2005 – é emblemático: para ser público não basta que isso conste no estatuto. É o dia-a-dia que confirma ou nega o que está no papel.

Com a propaganda de pública e a percepção de governamental, a Telesur tornou-se na prática uma TV Estatal. Tentando transmitir uma idéia maior que a de um simples governo, a emissora chavista promove uma nova concepção filosófica e de organização da sociedade, doutrinação essa que vai contra (inclusive) amplos setores da sociedade venezuelana excluídos desse projeto de poder e que não faz parte dos propósitos de uma TV Pública.

Em artigo n’O Estado de São Paulo intitulado "Pravda", Demétrio Magnoli, professor de Geografia Humana da USP, diz que a TV Brasil diferencia-se da Telesur porque carece de um programa político ideológico, sendo puramente governamental e, com isso, serviria aos interesses dos governos estabelecidos, como uma porta-voz da verdade, aos moldes do jornal soviético Pravda.

[#2: Instauração por Medida Provisória >>]

[QUADRO: Exemplos de TV Pública no Brasil e no Mundo - TV Cultura e BBC]

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