domingo, 12 de outubro de 2008

Resenha: Clássicos do ARAUTO

Aos socialistas de todos os partidos

É a seus maiores inimigos ideológicos que Friedrich Hayek endereça “O Caminho da Servidão”, sua obra mais influente.

O socialismo é capaz de promover a igualdade sem restringir as liberdades individuais? As liberdades individuais conquistadas há séculos pela humanidade estão garantidas contra abusos do governo da vez? Um governo da maioria pode conduzir um povo pelo caminho da servidão? É buscando responder a essas perguntas que o liberal Friedrich Hayek escreve seu livro mais político e alarmante.

Publicado em 1944, O Caminho da Servidão (The Road to Serfdom) oferece uma visão pessimista do mundo no fim da 2ª Guerra Mundial, um período de ascensão dos regimes socialistas no Leste europeu, de consolidação da União Soviética como potência política e de generalização do Estado de Bem-Estar Social na Europa Ocidental.

Apesar da derrota dos regimes fascistas na Itália e na Alemanha, Hayek não enxerga naquele momento a extinção das ideologias coletivistas extremadas. Colocando no mesmo saco os modos “nacional socialista” (nazista) e “stalinista” de governo, o autor é categórico em atribuir à planificação da economia a responsabilidade por todas as ameaças aos princípios democrático-liberais.

Após notar que a interferência do Estado na vida econômica - com a supressão da livre escolha profissional em tempos de conflitos, por exemplo - constitui-se no germe para a aniquilação de todas as liberdades individuais, o autor lança fortes argumentos contra os princípios centralizadores.

Argumentos que dão nome a capítulos como “Segurança e Liberdade”, em que alerta para a justificativa da falta de segurança financeira ou laboral, típica dos ciclos econômicos, como pretexto para a concentração do poder. “Porque os piores se põem à cabeça” mostra como governos em moldes totalitários selecionam sujeitos amorais e de mente restrita para seus cargos de chefia. Já o capítulo “O fim da verdade” discute o uso manipulador da propaganda coletivista, que vende a proposta de plano como o único meio capaz de alcançar os fins idealizados socialmente e, por isso, é justificável sob quaisquer hipóteses.

Hayek ataca também o embrião do que se transformaria posteriormente no Estado de Bem-Estar Social. O alerta é feito especialmente à Inglaterra que, sempre porta-voz dos ideais liberais, deixava-se cativar pela proteção social, em moda naquele tempo. Por ser um meio-termo entre o liberalismo e o socialismo, o Welfare State seria muito perigoso, porque dependente da decisão de homens ao invés do arbítrio pelas normas.

O culto à supremacia da lei e à previsibilidade das instituições marca o texto que, desde o princípio, tenta não parecer uma apologia ao clima quase anárquico do laissez-faire. A ojeriza às exceções e às aberturas de precedentes não se dá sob o prisma do curto prazo e das necessidades urgentes e, sim, pela deturpação dos valores no longo prazo, que poderia conduzir ao tolhimento das vontades individuais e à conseqüente ascensão do totalitarismo.

Esse postulado dá um banho de água fria em todos os governos que optam pela Teoria Geral de Keynes como uma cartilha de bons modos. O autor não nega que a intervenção do Estado no âmbito da produção possa melhorar a situação caótica de desemprego em certos períodos. A crítica de Hayek, no entanto, é mais fundamental. Seu alvo são os chiados que o intervencionismo cria nos mecanismos de incentivo dos agentes do mercado, particularmente firmas e trabalhadores. Isso porque a planificação pode converter-se em privilégios a certos grupos de interesse, já que suas determinações partem – em última instância – do bel-prazer de indivíduos dotados de poder decisório sobre toda a nação. É por estabelecerem-se fora do anonimato do mercado que esses benefícios são ilegítimos.

Apesar de valer-se de uma linguagem mais científica, O Caminho da Servidão é, sem dúvida, uma obra para as massas. Sem a pretensão doutrinadora do panfletário Manifesto do Partido Comunista, de Karl Marx, o livro é uma ode ao liberalismo, e busca convencer os desiludidos do pós-guerra da necessidade de contestar o pensamento único, seja ele qual for.
Para quem acha que foi Milton Friedman o tutor do neoliberalismo posto em prática por Ronald Reagan e Margaret Thatcher, O Caminho da Servidão abrirá um horizonte muito mais amplo para o entendimento dos regimes planificadores como uma solução tão perversa.

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